Salvador Dali

É esticando a corda das cidades que desbotam
Que o soltar dos sexos nas províncias
Faz crescer os sentimentos decrépitos do pai
Na busca duma nova vegetação
Onde as noites em combustão
Proíbam ao local de mostrar o intuito do nariz

É lendo as sementes imperceptíveis dos desejos
Que a agulha cessa com delicadeza
Entre o último minuto da aranha e do narcótico

Na cerâmica do íris e do ponto de suspensão
Onde a agulha se amarra em torno da falsa coragem
Do dedo pudico e da paragem nas estações

É pavimentando as ruas com ninhos de pássaros
Que o piano confuso dos gigantes
Esquece em beneficio da fome
A grandeza da mudança dos cantos desmedidos
De dois seres que se afastam

É aceitando a serventia das ferramentas ferrugentas
Constatando apaticamente a boa fé do metal
Que as mãos se abrem às delicias dos perfumes
E outros pequenos diabos das festividades
No fundo dos bolsos riscados de vermelho

É agarrando-se a uma cortina de moscas
Que a enxuta pecadora se defende dos marinheiros
Besta e redonda como a maçã não se interessa pelo mar

A madeira que falta na floresta que nem ali está
O encontro que não aconteceu e para beber
A verdura nos copos e uma boca que não fora feita
Que para chorar uma arma único termo de comparação
Com a mesa com os copos com as lágrimas
E a sombra forja o esqueleto do cristal de rocha

É para não deixar vazios entre nós estes olhos nossos olhos
Que ela estende os seus braços nus
A garota sem jóias a garota nua de pele
Seria preciso para aqui e para além rochas e vagas
Mulheres para nos distrair e nos enroupar
Ou cerejas de esmeralda no leite do orvalho

Tantas madrugadas breves nas mãos
Tantos gestos maníacos para dissipar a insónia
Sob a trepidante noite da roupa
Face à escada em que cada degrau é o prato duma balança

Em frente dos pássaros treinados contra as correntes
A estrela pesada do bem-estar rasga as veias

Tradução: Fernando Oliveira
Este poema provém do tema intitulado : A vida imediata " de Paul Eluard- 1932 -

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